Após ver vários debates na internet e a total desinformação quando aos limites da utilização da ayahuasca, venho clarear e informar a legalidade, através desse parecer jurídico.
Inicialmente, cabe trazer que a lei 11.343/06 em seu art. 2º define que:
“Art. 2º Ficam proibidas, em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a hipótese de autorização legal ou regulamentar, bem como o que estabelece a Convenção de Viena, das Nações Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971, a respeito de plantas de uso estritamente ritualístico-religioso.”
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11343.htm
No Brasil, quem define o que é droga é a ANVISA, que o fez através da Portaria 344 de 1998, lançando uma lista das substâncias de uso proibido em território nacional. Na lista F2 prescreve:
“LISTA F2 – SUBSTÂNCIAS PSICOTRÓPICAS
(…) 9.DMT (3-[2-(DIMETILAMINO)ETIL] INDOL)”
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/svs/1998/prt0344_12_05_1998_rep.html
Como sabemos, o DMT é um dos princípios ativos presentes na Ayahuasca, assim, a bebida só não é proibida no Brasil quando utilizada no contexto religioso.
O Brasil é signatário da Convenção de Viena, respeita a diversidade e ampla religiosidade do seu povo, inclusive protegendo o direito do exercício religioso das instituições e famílias que utilizem a AYAHUASCA.
Nesse sentido, após diversos estudos, realizados por décadas, o CONAD lançou a RESOLUÇÃO Nº 1, DE 25 DE JANEIRO DE 2010, da qual disciplina quando há a utilização religiosa da ayahuasca, bem como, definindo de forma expressa que não há contexto religioso em quem pratica o comercio da bebida, agindo, desta forma, fora do contexto religioso. Vejamos:
“IV.II – COMERCIALIZAÇÃO
(…) 26. Quem vende Ayahuasca não pratica ato de fé, mas de comércio, o que contradiz e avilta a legitimidade do uso tradicional consagrado pelas entidades religiosas.”
Desta forma, quem pratica o comércio da Ayahuasca, está utilizando uma bebida que possui DMT de forma diversa ao quanto permitido legalmente.
E o artigo 33 da lei 11.434/06 prevê:
“Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.”
Podemos afirmar que quem vende ou expõe a venda a Ayahuasca que possui o DMT (droga proscrita na resolução 344 da ANVISA), estará fazendo em desacordo com a determinação legal e regulamentar (estrito uso religioso), incorrendo na prática do tipo penal do art. 33 da lei de drogas.
E mais, para que o crime ocorra, basta a simples postagem na internet ofertando/vendendo a Ayahuasca, já se caracteriza a prática do crime de tráfico de drogas.
Da mesma forma, a exposição á venda de “micro doses de ayahuasca”, por claramente se tratar de uma bebida com DMT, fora do contexto religioso, também se trata de prática de crime de tráfico de drogas.
Mas não para por ai. Se a prática da venda de ayahuasca ocorrer com a associação de duas ou mais pessoas, estas pessoas incorrem em outro crime:
“Art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º , e 34 desta Lei:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa.”
Nesse sentido, se um casal começar a praticar a venda de ayahuasca, além de praticarem o tráfico de drogas do art. 33, também incorrem no art. 35, qual seja, associação para fins de tráfico.
Mas há que se fazer uma ressalva, pois a mesma legislação que proíbe o comércio, e o termo é esse mesmo PROÍBE, também reconhece a necessidade do custeio da fabricação, transporte e manutenção do plantel do Jagube e Chacrona, diferenciando-o do comercio (atividade voltada ao lucro):
“27. A vedação da comercialização da Ayahuasca não se confunde com seu custeio, com pagamento das despesas que envolvem a coleta das plantas, seu transporte e o preparo. Tais custos de manutenção, conforme seja o seu modo de organização estatutária, são suportados pela comunidade usuária. E é evidente, também, que a produção da Ayahuasca tem um custo, que pode variar de acordo com a região que a produz, a quantidade de adeptos, a maior ou menor facilidade com que se adquire a matéria prima (cipó e folha), se se trata de plantio da própria entidade ou se as plantas são obtidas na floresta nativa, e tantas outras variáveis.
CONAD – Resolução nº 1, de 25 de janeiro de 2010.”
Há um universo de distância entre ambas as práticas (comércio e custeio), certo que o custeio da produção é lícito, agindo dentro do quanto a lei determina, inclusive quanto as contribuições para o custeio do trabalho:
“28. Historicamente, porém, de acordo com a experiência das entidades religiosas chamadas a compor o Grupo Multidisciplinar de Trabalho, esse custo é partilhado no seio da instituição por meio das contribuições dos membros de cada entidade. Os sócios respondem pelas despesas de manutenção da organização religiosa, nas quais estão incluídos os gastos com a produção da Ayahuasca, com prestação de contas regular.
CONAD – Resolução nº 1, de 25 de janeiro de 2010”
Pelo todo exposto, a simples prática de publicar na internet a exposição à venda de Ayahuasca já se configura a prática do crime definido com tráfico de drogas, podendo ser denunciado as autoridades policiais.